Nós e os outros: a Saúde (parte 1)

Discutir o sector da saúde é uma discussão em voga nos nossos dias. Muito se tem falado sobre o sector da saúde em Portugal e o seu carácter despesista. Pouco se tem falado dos resultados do sector da saúde e principalmente, quase nem se fala do que os outros países da OCDE têm feito neste sector, e qual o nosso posicionamento relativo face a estes nos principais indicadores. A discussão sobre o sector da saúde deve ser acima de tudo uma discussão muito fundamentada. É que em causa está nada mais nada menos do que a própria vida dos nossos cidadãos e o seu bem-estar.

Para esta análise, foram seleccionados 17 países da OCDE, todos eles pertencentes à esfera europeia e mediterrânica.
Em 2008, a despesa do sector da saúde atingiu em Portugal um valor de cerca de 10% do PIB. Este valor por si só diz-nos muito pouco, porque é preciso enquadrá-lo não só com a evolução histórica mas também com os gastos dos outros membros da OCDE e claro, com os resultados obtidos desse investimento. Do primeiro gráfico, a despesa em saúde em Portugal, medida em % do PIB, é uma das mais elevadas da nossa amostra de países. Mas curiosamente, alguns dos países tidos como mais desenvolvidos e ricos, gastam ainda mais do que nós, como é o caso da Holanda e Alemanha. Este gráfico diz-nos que em percentagem do PIB, somos dos países que mais investimos. Mas o segundo gráfico, medido pela despesa per capita (por habitante) em Paridades Poder de Compra (PPC), diz-nos que esse investimento é um dos mais baixos da amostra seleccionada.Este segundo indicador é muito relevante, e mais relevante se torna porque mede o esforço realizado por habitante, e logo em PPC, que é uma medida que desconta os custos de vida materiais, e harmoniza desta forma o indicador. Assim, o segundo gráfico aponta para uma diferença de cerca do dobro, entre o que o líder Holanda e Portugal investem na saúde. Com o indicador harmonizado, Portugal figura entre os países que menos investem em saúde da amostra seleccionada.

O debate sobre o sector da saúde, procura quase sempre evidenciar o peso do investimento público nesta área e ultimamente, as tendências entre os economistas e políticos portugueses têm revelado uma necessidade do Estado racionalizar o seu investimento na saúde, reduzindo os gastos, privatizando ou externalizando actividades para o sector privado, etc. Mas será isso uma política eficaz? Vejamos o terceiro gráfico.
Portugal é já um dos três países, em que o Estado menos investe na Saúde, face à despesa total que o sector movimenta. Situações mais "liberais" são apenas encontradas na Holanda e em Israel, onde são fundos privados a financiar o restante dos gastos. Seja como for, em nenhum caso da amostra, existe investimento público inferior a 50% do total gasto no sector, e países muito desenvolvidos, como a Dinamarca, Luxemburgo ou Reino Unido, têm gastos públicos equivalentes a 85% da despesa total. Em Portugal, esse número fica-se pelos 65%.
Mas de onde resulta então toda a polémica e as célebres derrapagens dos orçamentos públicos portugueses relacionados com esta área da saúde? Na minha opinião, deve-se a uma componente: os medicamente e a respectiva comparticipação pública. No último gráfico, Portugal é dos países que em termos relativos, mais gasta em medicamentos. Gasta quase o dobro de países como a Holanda e o Luxemburgo, e três vezes mais que a Dinamarca, o país que menos gasta em termos relativos. Curiosamente, neste campo, podemos evidenciar que os países que mais gastam em medicamentos são os menos ricos da amostra. Seja como for, o peso dos gastos em medicamentos em Portugal é de cerca de 20% da despesa total do sector da saúde, um valor excessivo face à média da OCDE, e que só pode ser evitado de forma sustentada através de uma mudança comportamental tanto dos médicos como dos doentes.


NOTA: Todos os dados utilizados provém da OCDE.

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